Perante tantas atualizações de melhoramento dos sistemas e das apps, nunca pensei ficar intrigada com tal tema, numa terça-feira à tarde, ao ponto de questionar, filosoficamente, a forma inorgânica como comunicamos ou como querem que comuniquemos. Eu sabia que a minha estupefação seria inútil, mas foi a mesma que transmitiu o meu pensamento a duas pessoas aleatórias. Ambas concordaram comigo (forçosamente ou não) e pouco mais disseram. Contudo, permaneci desassossegada, porque percebi a profunda disfuncionalidade que a nova funcionalidade do WhatsApp nos trará a longo prazo e ninguém repara. Agora, em vez de escrevermos uma resposta com letras ou imagens, podemos apenas reagir sobre a mensagem recebida com seis emojis (seis emojis!?). Até posso entender o lado prático de quem usa redes sociais diariamente e em simultâneo, mas paremos um pouco. Paremos para pensar. Para onde caminhamos? Para a imaterialidade? Para um chão sem chão; para a ausência das palavras; para o alzheimer coletivo. A redução dos caracteres, a obsessão pelo scroll, a fugacidade dos stories e o vício do binge-watching tornam-nos reféns de uma posição passiva e de uma comunicação pobre. O amorfismo da distração e do facilitismo exercem uma leve lobotomia e comprometem o livre-arbítrio. Tristemente, acredito que daqui a uns largos anos já não se escreva nem leia livros. Oxalá que algumas obras perdurem e que uma delas seja o Ensaio sobre a cegueira de José Saramago. Assim, as gerações vindouras irão perceber o seu presente através do nosso passado.
Centenário de José Saramago