resina: pedra de sol, cujo cheiro só se revela no leve toque das pontas dos dedos das nossas mãos.
sexta-feira, 27 de setembro de 2024
quinta-feira, 26 de setembro de 2024
a sede da última gota
Que me importa ficar com lama!
Quem ama
vai ao fundo do poço
buscar a última gota d’água
que nunca apagará
a sede
de quem verdadeiramente ama.
quarta-feira, 25 de setembro de 2024
Paixão e Amor
(estar com na solidão)
Paixão é humano.
Amor é divino.
Paixão é carne.
Amor é espírito.
Paixão é fugaz.
Amor é eterno.
Paixão é música.
Amor é silêncio.
Paixão é incêndio.
Amor é brasa.
Paixão é selva.
Amor é jardim.
Paixão é banquete.
Amor é jejum.
Paixão é poema.
Amor é prosa.
Paixão é estar perto.
Amor é estar longe.
Paixão consome-se.
Amor contém-se.
Paixão resiste.
Amor persiste.
segunda-feira, 23 de setembro de 2024
a arte de voar
un beau jour, c’est l’amour
(Françoise Hardy, “Le temps de l’amour”)
ser pássaro: planar e voar em queda livre.
Perceber as diferentes intensidades da vida e as suas circunstâncias é perceber os vários graus de amor e liberdade. Escutar a verdade que nos é pedida e agir com diligência é uma graça.
terça-feira, 17 de setembro de 2024
o defeito do "amor fati"
Aceitar as circunstâncias da vida, por contrariedade, é como tomar uma dose de eutanásia, mas para uma morte lenta e dolorosa.
breve reflexão debaixo de um céu fechado
Gera-me uma certa estranheza observar como a vida continua, mesmo com tudo à volta a morrer.
De onde vêm as cinzas que caem no parapeito da minha janela? De quais eucaliptos? De quais famílias? Quantas mais árvores e casas serão precisas destruir, para que o Desumano finalmente respire?
Chega a ser desconcertante olhar para um céu fechado, num amarelo apocalíptico, que estrangula o sol e aniquila o resto das cores que naturalmente iluminam a mísera condição humana.
sexta-feira, 13 de setembro de 2024
rosto de água
A água que cai no teu rosto torna-se sagrada e embeleza a sede que sinto por ti.
Uma sede infinita que só deixa de ser sede, quando do teu rosto bebo,
incansavelmente,
todas as águas doces e salgadas.
quarta-feira, 11 de setembro de 2024
o ofício de esculpir a ausência
O meu coração foi levado pelas tuas mãos de sol, para uma ilha, onde é sempre dia.
Agora, no lugar do antigo pedestal do meu coração, é sempre noite e só corre o zumbido dos ventos gélidos que constroem as estátuas da tua ausência.
terça-feira, 10 de setembro de 2024
mão no mosaico, cabeça na terra, pés no céu
Que tristeza tão inútil essas mãos
que nem sequer são flores
que se dêem:
abertas são apenas abandono,
fechadas são pálpebras imensas
carregadas de sono.
Eugénio de Andrade IN As Mãos
Por vezes, são precisos cinco dedos de sol para que o dia se ilumine sob o mosaico amarelo.
A mão, segura as flores brancas, entrelaçadas como heras, numa dança imparável de geometria descritiva, com coreografias simétricas que alcançam a harmonia do azul do céu.
A mão, segura as flores brancas, entrelaçadas como heras, numa dança imparável de geometria descritiva, com coreografias simétricas que alcançam a harmonia do azul do céu.
A mão esquerda, aberta, sente a candura dos movimentos, das cores, dos tons suaves e pastéis.
A mão direita, fechada, adormece ao sol, embalada pela brisa do outono que já se avizinha no entardecer precoce.
quarta-feira, 4 de setembro de 2024
a contemplar as nuvens
Qualquer dia acaba-se a fita
Mais uma frase gira não me vai ajudar
Geração-retro com tudo a perder
(Hércules, "Só quero")
Quero deixar de querer.
Quero deixar de ter.
Quero deixar de ter.
Quero deixar de sentir.
Deixar de querer, ter e sentir todas as vontades impossíveis e imaginárias.
Só olhar os vários céus.
Só respirar o momento presente,
sem correntes de ar do passado,
sem nortadas de futuros próximos e distantes.
Simplesmente preciso de deixar de querer, em vez de continuar a querer deixar de querer.
Em estado de estoicismo, sento-me no banco do jardim da minha solidão para observar o cisne da melancolia e para ouvir a tua respiração que, por sinal, é também a dela.
segunda-feira, 2 de setembro de 2024
ser um ser só
Nós nascemos sozinhos, vivemos sozinhos e morremos sozinhos. Somente através do amor e das amizades é que podemos criar a ilusão, durante um momento, de que não estamos sozinhos.
Orson Welles
Para quê ansiar pela Ilusão do Amor e da Amizade? Tudo se desfaz e nada restará para além do pó que, em breve, seremos. Ossos amontoados e partidos, cabelos palha, desfeitos; assim jazeremos na terra húmus que também é terra mãe: "Deixem-me ir para a cova agarrado a este nada imenso, que me dourou as mãos e me deixou atónico." (Raul Brandão).
Ah, Memórias do Subterrâneo esquecidas num diário de sonhos falhados. As suas folhas bolorentas perguntam-me altivamente: "o que será melhor: uma felicidade barata ou um sofrimento sublime?" (Fiódor Dostoievski). Na tentativa de resposta, fraquejo, porque a imensidão do Nada emudece o Tudo que há em mim.
A única eternidade possível é a de sermos cadáver adiado, numa longa e implacável espera ou corrida contra o tempo. Um tempo humanizado, logo inexistente.
Antes de nascermos, já estamos mortos. Após morrermos, continuamos mortos. A vida é apenas um sopro, onde Nada vale a pena pelo Tudo que se destrói.
Subscrever:
Mensagens (Atom)